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O corpo depois da morte: uma reflexão

O corpo depois da morte: uma reflexão
Algumas pessoas afirmaram que fui desrespeitoso com o corpo material, quando afirmei que podemos fazer qualquer coisa com ele após a morte. Vamos analisar com calma esse “respeito” que supostamente devemos ter o corpo material.
 
Ninguém trata o corpo material com mais descaso que a natureza.. pois tão logo a pessoa morre, o corpo começa a entrar em estado de putrefação… e depois vai ser devorado pelos vermes da terra…
 
O corpo começa a exalar um odor fétido que ninguém consegue chegar perto. A decomposição do corpo vai chegando a um estado em que a pessoa nem pode mais ser reconhecida e toda a beleza que tanto valorizamos do corpo material vai sendo destruída pela força do tempo e pelos vermes e microrganismos…
 
Onde está o respeito da natureza com aquele corpo? A inteligência da vida despreza completamente a forma daquele corpo… despreza se a pessoa foi rica ou pobre, se foi presidente ou se foi mendiga.
 
Todos tem o mesmo destino, que é a decomposição do pó que retorna ao pó da terra. Que respeito é esse que temos pelo sagrado corpo material que a própria inteligência da natureza não tem?
 
A natureza trata o nosso corpo com desdém, assim como qualquer outro corpo… e não como algo que mereça nosso “respeito”. Esse “respeito” pelo corpo material só existe em nossa mente, em nossa imaginação… ele não existe na realidade das coisas. No fundo temos um forte apego ao corpo material e por isso desejamos trata-lo com “respeito” e “consideração”.
 
Queremos dar um último valor a algo que, em essência, não tem nenhum valor. Não podemos ver a alma da pessoa, não podemos ver sua energia mais profunda, seu âmago, sua essência. Só podemos ver o corpo material e sua forma. Por isso, atribuímos uma importância ao corpo e a forma que eles não possuem, pois é somente isso que conseguimos perceber. Acreditamos que o corpo é a pessoa… mas isso é falso.
 
Não conseguimos imaginar a pessoa sem o corpo material, pois identificamos tanto a pessoa com a matéria, que ela passa a ser a própria matéria aos nossos olhos. Mas nem por isso, a natureza tem qualquer consideração pelo corpo material.
 
Aliás, precisamos realmente refletir a esse respeito e sobre essa consideração diante do corpo material morto e inerte. Quantas pessoas falam em respeito e consideração pelo corpo morto, mas ao mesmo tempo tratam seu próprio corpo, ainda vivo, sem nenhum respeito e consideração? Quantas pessoas fumam e bebem?
 
Quantas pessoas se alimentam de forma completamente tóxica, ingerindo refrigerantes e doces? Quantas pessoas comem alimentos ultraprocessados, cheios de conservantes, agrotóxicos, transgênicos e aditivos diversos? Quantas pessoas fazem exercício físico em respeito ao corpo material? Quantas pessoas cuidam bem do seu veículo físico ainda em vida, ao invés de ficar se preocupando com seu destino após a morte, quando o fim inexorável do corpo será a putrefação?
 
Precisamos refletir sobre isso… de que adianta ter o maior respeito e cuidado com o corpo morto de outra pessoa, se desprezamos esse mesmo respeito com nosso próprio corpo ainda vivo? Isso sem mencionar quantas pessoas querem cuidar bem do corpo, dar-lhes todas as pompas de um ritual caro e belo, mas em vida quase nem visitavam a pessoa e nem lhes davam importância, amor e respeito.
 
Outras pessoas argumentam que precisamos dar um destino limpo ao corpo material, caso contrário ele causará poluição na terra. Será mesmo que podemos falar sobre poluição?
 
Logo o ser humano que é o habitante do planeta que polui indiscriminadamente e sem nenhuma preocupação o planeta? Quem somos nós para falar de poluição com um corpo físico na terra se nós poluímos os rios com nosso esgoto? A poluição que promovemos na natureza com nosso esgoto e com nosso lixo é infinitamente pior do que a escolha de enterrar os corpos dos mortos, ou se crema-los.
 
Estamos causando muito mais mal a natureza com nossa poluição de lixo, de esgoto e dos gases tóxicos que jogamos na atmosfera do que simplesmente enterrar corpos ou crema-los. No fundo observamos que todo esse argumento sobre dar um destino limpo e respeitoso ao corpo material nada tem a ver com a preocupação com o meio ambiente ou com o espírito, mas sim com nosso próprio apego ao corpo daquele que partiu.
 
O ser humano deveria criar altares para reverenciar o corpo material, pois é isso que ele mais idolatra nesse mundo. Tudo o que fazemos, desde o início ao fim do dia, é procurar dar o máximo de prazer e perpetuação ao corpo… mesmo sabendo que em pouco tempo iremos perde-lo.
 
Por isso, eu repito o que eu disse: não tem importância o que será feito com o corpo material após a morte. Pode enterrá-lo, crema-lo, dar aos urubus ou joga-lo em qualquer lugar. Isso não tem importância.
 
O problema não é o destino do corpo… o problema é a preocupação com o culto ao corpo, a reverência a ele mesmo após a morte. Se o corpo é mera veste passageira, ninguém deveria se preocupar com sua condição após a morte, pois enquanto as pessoas pensam no corpo e o valorizam, elas deixam de valorizar aquilo que é o essencial: a alma, o espírito, a essência de cada um. O corpo apodrece e vai ficar aqui… mas a alma é nossa realidade pela vida eterna.
 
Mais uma vez vou citar O Livro dos Espíritos sobre esse tema:
 
Questão 196 (O Livro dos Espíritos)
 
a) — É o corpo que influi sobre o Espírito para que este se melhore, ou o Espírito que influi sobre o corpo?
“Teu Espírito é tudo; teu corpo é simples veste que apodrece: eis tudo.”
 
309. Como considera o Espírito o corpo de que vem de
separar-se?
 
“Como veste imprestável, que o embaraçava, sentindo-se feliz por estar livre dela.”
a) — Que sensação lhe causa o espetáculo do seu corpo em decomposição?
 
“Quase sempre se conserva indiferente a isso, como a uma coisa que em nada o interessa.”
 
(O Livro dos Espíritos)
 
(Hugo Lapa)